Ford rompe com modelo centenário e aposta em nova fábrica para enfrentar elétricos chineses

Ford rompe com modelo centenário e aposta em nova fábrica para enfrentar elétricos chineses

Investimento ousado para acelerar a eletrificação

A montadora americana Ford está promovendo uma transformação profunda em suas operações industriais com o objetivo de acelerar a transição para veículos elétricos. Pressionada por tarifas impostas pelo governo dos EUA desde abril e pelo fim iminente dos subsídios federais para elétricos, previsto para 30 de setembro, a empresa viu seus resultados no segundo trimestre voltarem ao vermelho. Diante desse cenário, a Ford lançou uma iniciativa ousada que representa uma virada estratégica para o futuro da mobilidade.

Fábrica em Kentucky será reformada para nova linha de elétricos

De acordo com o Financial Times, a Ford planeja transformar completamente sua fábrica em Louisville, no estado de Kentucky, antes dedicada à produção de veículos a combustão. O plano é converter a unidade em uma fábrica de veículos elétricos voltada para a produção em massa de picapes elétricas com bom custo-benefício. O investimento estimado nessa reforma é de US$ 2 bilhões.

A empresa pretende utilizar uma nova plataforma elétrica universal que permite reduzir em 20% o número de componentes e aumentar em 15% a velocidade de montagem. A partir de 2027, o local deverá iniciar a produção de uma picape elétrica de médio porte com quatro portas, com preço inicial previsto de US$ 30 mil — significativamente mais acessível do que o modelo atual F-150 Lightning, cujo preço começa em US$ 55 mil.

Segundo a Ford, esse novo modelo será competitivo inclusive frente aos veículos elétricos chineses de baixo custo, como os da BYD, especialmente em mercados internacionais como a Europa.

Nova abordagem rompe com o histórico “Sistema Ford”

Durante anúncio realizado em 11 de agosto, o CEO da Ford, Jim Farley, destacou que a mudança vai muito além de um novo veículo: trata-se de uma reformulação total no método de produção. Vestido com uniforme de operário, Farley afirmou que a tradicional linha de montagem da fábrica foi desmontada e redesenhada por completo. Ele comparou o momento atual à era do Modelo T, quando Henry Ford revolucionou a indústria ao adotar o sistema de linha de montagem contínua.

Essa referência não é casual: com o novo projeto, a empresa abandona o histórico “Sistema Ford” — em que os veículos se movem por uma única linha e os funcionários adicionam peças ao longo do processo — para adotar o chamado “Sistema Universal de Produção de Elétricos”. Nesse novo modelo, três linhas distintas produzem a parte dianteira, a traseira e o pacote de baterias, que depois são integrados em uma única estrutura.

Redução de peças e montagem mais eficiente

Com esse novo método, a Ford afirma que será possível reduzir o uso de peças como parafusos, rebites e chicotes elétricos em até 20%, além de cortar o tempo total de montagem em até 40%. Outro benefício está relacionado à ergonomia: os funcionários não precisarão mais se contorcer ou realizar movimentos repetitivos e desgastantes, o que torna o trabalho mais seguro e eficiente.

Equipe de elite e inspiração em práticas da Tesla

O projeto está sendo liderado por Doug Field, engenheiro responsável pelo desenvolvimento do Tesla Model 3, e conta com uma equipe interna de inovação dedicada. Farley afirmou que não há “uma única solução mágica”, reconhecendo os desafios técnicos envolvidos. Segundo Field, a equipe enfrentou uma série de obstáculos de engenharia de alta complexidade.

A Tesla também estuda um conceito semelhante, conhecido como “processo unboxing”, para seu futuro modelo Cybercab. No entanto, até o momento, a empresa de Elon Musk ainda não conseguiu implementar a técnica de forma concreta.

Baterias produzidas localmente e foco na independência

Outro ponto importante da estratégia da Ford é a produção doméstica das baterias de fosfato de ferro-lítio (LFP), que não serão mais importadas da China. A empresa planeja produzir essas baterias em território americano, em um esforço para reduzir a dependência de fornecedores estrangeiros e fortalecer a cadeia de produção local.

Inovação como resposta ao avanço chinês

O movimento da Ford é visto como uma tentativa de se manter competitiva diante da crescente pressão exercida pelos veículos elétricos chineses de baixo custo. Farley não evitou o tema e reconheceu os desafios: “Como podemos competir com a BYD, que tem 700 mil funcionários e 200 mil engenheiros de powertrain?”, questionou. “Não temos como vencê-los em escala ou integração vertical. Mas na inovação, podemos superá-los”, declarou com confiança.

Com essa estratégia, a Ford sinaliza sua disposição em romper com métodos centenários para se adaptar ao novo cenário da indústria automotiva global, onde eficiência, inovação e competitividade serão os pilares da próxima geração de veículos.